Em entrevista à Rede Brasil Atual, Jean Wyllys afirma que eleição de pastor para presidir CDH é consequência da disputa partidária


A posse do pastor Marco Feliciano (PSC-SP) como presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados fala muito sobre as disputas políticas e os acordos partidários em curso no Brasil com vistas às eleições presidenciais de 2014. Essa é a tese defendida pelo parlamentar Jean Wyllys (PSOL-RJ) em entrevista à Rede Brasil Atual. Muito identificado com grupos homossexuais, o deputado afirma ainda que os recentes acontecimentos envolvendo a comissão também dizem respeito a uma "disputa ideológica" em torno dos direitos humanos no país.

"O que acabamos de assistir na Comissão de Direitos Humanos e Minorias está conectado com o jogo político mais amplo e com a disputa de poder envolvendo PT, PSDB e PMDB. É uma pena que parte da imprensa tente folclorizar a disputa pela comissão. Tenta-se dar a aparência de que se trata de uma briga entre mim e Marco Feliciano, dizendo que me oponho à sua indicação porque ele é cristão", explica Jean Wyllys. "Mas meu problema não tem a ver com o fato de ele ser pastor evangélico. É uma questão política: existe uma disputa entre fundamentalistas religiosos e deputados progressistas, que dialogam com os movimentos sociais de esquerda."

De acordo com o parlamentar do PSOL, existe uma "direita cristã" que está aliada com os setores mais conservadores da sociedade – ruralistas, por exemplo – para combater no Congresso Nacional uma perspectiva dos direitos humanos que luta pela inclusão das minorias. Prova disso seriam os largos sorrisos exibidos pelo deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ) após a eleição de Marco Feliciano como presidente da comissão. Militar, Bolsonaro é conhecido por suas defesas da ditadura e seus ataques contra negros e homossexuais. Jean Wyllys afirma que, dos 18 membros titulares da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, 11 são pastores. Apenas o PSC possui seis membros, graças à renúncia de parlamentares de PMDB e PSDB.

Essa nova configuração deve conferir ao grupo uma noção de direitos humanos radicalmente diferente da que existia até então. "A força da comissão não está na comissão em si, mas no trabalho que desenvolvemos", explica o deputado do PSOL. "Queremos discutir temas como os grupos de extermínio nas periferias, tortura nas prisões, violência contra mulheres e homossexuais, legalização do aborto, a regulamentação das drogas leves para combater o narcotráfico, a regulamentação da prostituição para garantir o direito das prostitutas e combater o tráfico de mulheres."

Jean Wyllys acredita que essas pautas não terão cabida na comissão presidida por Marco Feliciano. "Eles têm uma perspectiva assistencialista e caritativa dos direitos humanos, que é como as igrejas trabalham em relação com a pobreza. Essa luta exclui a luta das minorias estigmatizadas, como os homossexuais, torturados pela ditadura e populações tradicionais. É a mesma ideia de distribuir sopão na praça. A caridade é importante, mas não resolve o problema nem garante os direitos das minorias. Não quer mexer nas estruturas da sociedade que perpetuam a desigualdade e a discriminação", compara. "A gente não pode aceitar essa situação. Por isso estamos reagindo, para evitar que a noção transformadora dos direitos humanos se percam aqui dentro."

Durante a divisão da presidência das comissões da Câmara, em 27 de fevereiro, o PT abriu mão da Comissão de Direitos Humanos e Minorias, que já comandou em 12 ocasiões e que comandava até a última quinta-feira (7) com o deputado maranhense Domingos Dutra. Como tinha direito a dirigir apenas três colegiados, o partido teve outras prioridades – e foi obrigado a ceder os direitos humanos ao PSC. "É a governabilidade", define Jean Wyllys, criando um novo termo para o que acaba de assistir. "Pulamos da realpolitik para a surrealpolitik. Quando você rifa o direito das minorias e contraria descaradamente o princípio da democracia, que deveria protegê-las, você abandona a realpolitik para fazer surrealpolitik."

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